Serguei Monin – Brasil de Fato | Moscou (Rússia) |
O presidente russo, Vladimir Putin, realizou nesta quinta-feira (19) a sua tradicional coletiva de imprensa de fim de ano, na qual falou sobre os resultados de 2024 para a Rússia na economia, política interna e externa. Neste ano, o evento teve um formato híbrido com a “linha direta com o presidente”, respondendo perguntas enviadas pela população.
Um dos assuntos de destaque foi a crise na Síria, com a queda do ex-presidente Bashar al-Assad, que recebeu asilo de Vladimir Putin e está em Moscou. O presidente russo informou que ainda não se encontrou com Assad desde a sua chegada a Moscou, mas disse que planeja fazê-lo. “Certamente eu falarei com ele”, acrescentou.
Ao comentar os desdobramentos que levaram à tomada de poder pelos grupos rebeldes de oposição na Síria, o presidente russo declarou que a Rússia alcançou os seus objetivos no país, evitando a criação de um enclave terrorista na Síria, considerando o apoio de Moscou a Damasco desde a Primavera Árabe e em meio à guerra civil no país.
“Você [jornalista dos EUA] falou sobre a Síria. Você quer apresentar tudo o que acontece na Síria como uma espécie de derrota da Rússia, garanto-lhe que não é assim. E vou dizer o porquê, porque viemos para a Síria há dez anos para que não fosse criado um enclave terrorista lá”, disse Putin na coletiva de imprensa.
De acordo com Vladimir Putin, “de uma forma geral”, a Rússia atingiu os seus objetivos no país. O líder russo observou que, atualmente, mesmo os grupos que lutavam contra as tropas governamentais na Síria “passaram por mudanças internas”.
“Não é à toa que hoje muitos países europeus e os Estados Unidos querem estabelecer relações com eles”, completou Vladimir Putin.
Além de possuir duas bases militares no país, a aliança da Rússia com a Síria tem grande importância geopolítica, servindo como contenção da influência dos EUA na região. A presença militar russa na Síria está inserida no contexto da histórica relação que Moscou tem com Damasco desde os tempos da Guerra Fria, durante o governo de Hafez Al-Assad, pai de Bashar Al-Assad, quando foi estabelecida a base naval de Tartus, se mantendo até hoje sob controle de Moscou e consolidando um ponto estratégico no Mar Mediterrâneo para a Rússia.
Em um contexto mais amplo, esta presença militar russa durante os últimos anos na Síria faz parte de uma estratégia geopolítica mais ampla que une a consolidação da influência russa no Oriente Médio e o seu prestígio de potência global – o que ganhou mais importância após a guerra da Ucrânia e o isolamento provocado pelo Ocidente.
Esta relação permitiu a manutenção de Assad no poder e exerceu a função de um contrapeso da Rússia aos avanços da influência ocidental no Oriente Médio. Agora, no contexto da reviravolta do poder na Síria, os esforços da Rússia em manter as pontes com a Síria, independente de quem se consolide no governo, estão ligados à prioridade russa de manter a estrutura destas bases operando.
Ainda sobre os desdobramentos no Oriente Médio, Putin classificou Israel como o “principal beneficiário” dos acontecimentos na Síria, condenando a “tomada de quaisquer territórios sírios”. Ao mesmo tempo, Putin afirmou que Israel está a “resolvendo as suas questões de segurança por si próprio”.
“Esperamos que Israel, em algum momento, deixe o território da Síria. Mas agora, está trazendo tropas adicionais. Já existem, creio, vários milhares de soldados lá. E tenho a impressão de que não só não vão sair, como eles vão ganhar impulso lá. Ainda assim, o principal beneficiário dos acontecimentos que ocorrem na Síria é, na minha opinião, Israel. E pode-se ter qualquer atitude em relação ao que Israel está faznedo. A Rússia condena a tomada de quaisquer territórios sírios”, completou.
Futuro das bases militares russas
Ao falar pela primeira vez sobre o futuro das bases militares russas no país, Putin indicou que as instalações devem ser preservadas, caso isto corresponda com os interesses das novas autoridades sírias.
“Devemos pensar sobre isto, porque devemos decidir por nós próprios como se desenvolverão as nossas relações com as forças políticas que agora controlam e controlarão a situação neste país no futuro. Os nossos interesses devem coincidir”, disse Putin.
De acordo com o presidente russo, a “maioria esmagadora” dos países do Oriente Médio defende a ideia de que a Rússia mantenha a sua presença militar na Síria.
“É claro que ansiamos muito pela paz e tranquilidade na República Árabe Síria. Mantemos relações com todos os grupos que controlam a situação e com todos os países da região. A esmagadora maioria deles nos diz que eles estariam interessados na permanência da nossa base militar na Síria”, completou.