O avanço do projeto de lei (PL) que propõe anistia aos envolvidos nos atos golpistas de 8 de janeiro representa mais do que uma disputa jurídica: é também um sinal político preocupante da consolidação de alianças entre a direita tradicional e a extrema direita no Brasil. Essa é a avaliação do cientista político e professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Claudio Couto, em entrevista ao Conexão BdF, do Brasil de Fato.
Para ele, o apoio de setores políticos ao PL revela uma “anistia política”, ainda que a jurídica possa não se concretizar. “Estamos vendo governadores e prefeitos, como o de São Paulo [Ricardo Nunes (MDB)], que se apresenta como direita tradicional, defendendo anistia a golpistas. É como dizer: ‘pode tentar um golpe de Estado, vamos continuar nos coligando com vocês porque não vemos nada demais nisso’”, critica.
Segundo Couto, esse apoio escancara que “há setores da direita brasileira que não são leais à democracia”. Ele indica que a tramitação do projeto, que teve teria conseguido mais do que as 257 assinaturas de parlamentares necessárias para aprovar o pedido de urgência, reforça a força dessa aliança. “A extrema direita vem sendo normalizada constantemente. É um problema muito grave”, pontua.
Mesmo que o PL seja barrado no Congresso, no veto presidencial ou considerado inconstitucional no Supremo Tribunal Federal (STF), o cientista político aponta que o movimento segue ativo. “Há uma resiliência da extrema direita. Ela ainda consegue mobilizar a população, a exemplo do ato na avenida Paulista promovido pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, e segue viva também com capacidade de mobilização no Legislativo”, alerta. Ele ressalta que o projeto de anistia é uma afronta ao STF e tem um longo caminho até uma improvável aprovação, que ainda depende de negociações com líderes partidários e da condução do presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB).
Couto ainda observa que há risco de ampliação do escopo do projeto, com tentativas de incluir outras figuras, como o próprio Bolsonaro, réu por tentativa de golpe, mesmo que hoje o texto atualmente se restrinja aos envolvidos diretamente na invasão aos prédios dos três Poderes. “Não estranharia se alguém, depois da primeira votação, resolvesse apresentar emendas com anistia a outros nomes que sequer foram julgados”, afirma. (Brasil de Faato)