Brasília, 28/09/2024

Brasília, 28/09/2024

Congresso tem mais poder que Ministério da Saúde sobre gastos com assistência hospitalar e atenção básica

De 2016 a 2023, o valor das emendas parlamentares — gastos indicados pelo Congresso no orçamento do governo — destinadas à saúde cresceu mais de quatro vezes. Pulou de R$ 5,7 bilhões para R$ 22,9 bilhões. Com isso, hoje, o poder do parlamento sobre o dinheiro que vai para duas áreas essenciais da assistência em saúde no país é maior que do próprio Ministério da Saúde. Informações de  Sara Curcino, G1 e TV Globo — Brasília.

Os dados, obtidos com exclusividade pelo g1, são de um levantamento feito pelo Instituto de Estudos para Políticas de Saúde (IEPS), em parceria com a Umane, uma associação civil sem fins lucrativos.

Os autores da pesquisa sustentam que parlamentares se valem “mais de critérios políticos” na hora de indicar gastos, diferentemente do ministério, que adota requisitos mais técnicos, pois considera o planejamento das políticas públicas que precisam de atenção.

Isso, portanto, pode comprometer a transparência da destinação do dinheiro para a Saúde.

Marcella Semente, analista de relações institucionais do Instituto, afirma que o Ministério da Saúde tem perdido recursos, que depois não são rastreáveis, ou seja, não é possível identificar qual ação foi financiada. E que a pasta tem mais capacidade que o Congresso de identificar os “gargalos” de cada região do país nessa área.

“Embora os recursos sejam direcionados para a saúde, não são recursos adicionais, trata-se apenas de uma mudança sobre quem define a alocação do orçamento, o que implica em uma fragmentação do financiamento das políticas públicas de saúde”, pontuou Semente.

“O órgão responsável por planejar e implementar as políticas de saúde, com capacidade de identificar gargalos e garantir equidade orçamentária regional, perde recursos que, em sua maioria, não permitem a identificação de para qual política ou ação foram destinados”, prosseguiu a analista.

influência do Congresso nos últimos anos foi maior que do Ministério da Saúde (MS) nas duas principais funções da pasta, se consideradas despesas não obrigatórias (discricionárias) do governo.

Nesse tipo de despesa, o ministério tem liberdade para aplicar o dinheiro de acordo com o que decidir priorizar. Assim como deputados e senadores escolhem para quais projetos ou políticas públicas o dinheiro das emendas vai.

O destino, o programa a ser contemplado, não é fixo. E, mesmo assim, certas modalidades de emendas (individuais e de bancada estadual) são impositivas, ou seja, precisam ser obrigatoriamente pagas pelo Executivo.

É esse poder do parlamento sobre o Orçamento que está gerando atrito entre os parlamentares e o Supremo Tribunal Federal (STF), que suspendeu a execução dessas emendas impositivas.

O estudo analisou duas áreas-chave do Sistema Único de Saúde (SUS), que são priorizadas pelo Ministério da Saúde:

  • Atenção Básica: prevenção e diagnóstico de doenças, primeiro nível de atenção em saúde. Exemplos são os postos de saúde, o pré-natal e a Estratégia Saúde da Família (ESF);
  • Assistência Ambulatorial e Hospitalar (AHA): atendimento em hospitais, especializado por áreas, como cardiologia, e também emergências e cirurgias, nas Unidades de Pronto Atendimento (UPA).

Esses são dois dos principais eixos que estruturam a assistência em saúde no Brasil. E o estudo revela que hoje estão sendo financiados mais por emendas parlamentares que por despesas não obrigatórias do Poder Executivo.

A execução orçamentária em emendas para as duas áreas é maior que a execução orçamentária das despesas discricionárias do MS.

No período analisado, o dinheiro das emendas foi progressivamente direcionado mais para despesas correntes (pagamento de água e luz, por exemplo), em detrimento dos investimentos (que servem para custear, por exemplo, obras como a construção de uma Unidade Básica de Saúde – UBS).

“Esses dados revelam a ampliação da influência do Congresso na destinação de recursos para duas áreas essenciais da saúde, e o consequente recuo do orçamento discricionário do Ministério da Saúde” explica Victor Nobre, assistente de relações institucionais do IEPS e um dos autores da pesquisa.

“É importante que haja equilíbrio nessa distribuição de recursos, considerando que é o Executivo o responsável pelo planejamento técnico e orçamentário para essas áreas”, arremata Nobre.

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