Brasília, 21/11/2024

Eleições 2024: centro e direita colocam a esquerda em sinal de alerta para 2026

Caroline Oliveira
Brasil de Fato 

Nas eleições municipais de 2024, o desempenho dos partidos no Brasil revela um domínio dos partidos de centro sobre a maior parte do território, um crescimento das siglas de direita e um declínio das lideranças de esquerda, se considerada a mudança do tamanho do eleitorado.

Segundo um levantamento da Nexus, com base em dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), 81 milhões de brasileiros serão governador por prefeitos filiados a legendas de centro, atingindo 52% do eleitorado. A direita, por sua vez, domina 36% (51,6 milhões) do total de eleitores, e a esquerda, 12% (17,8 milhões).

Em relação a 2020, o domínio do centro se manteve em 52%, a direita saiu de 34% para 36% e a esquerda caiu de 15% para 12%. Os partidos classificados como de centro incluem: Agir, Avante, MDB, Mobiliza, PMB, Podemos, PP, PSD e Solidariedade. Já os partidos de direita são: Cidadania, Democracia Cristã, Novo, PL, PRD, PRTB, PSDB, Republicanos e União Brasil. Por fim, os partidos de esquerda incluem: PCdoB, PDT, PSB, PT, PV e Rede.

A eleição aponta para a liderança do PSD em número de prefeitos, com 891 municípios (16%), seguido pelo MDB com 864 prefeitos (15,5%) e pelo PP com 752 prefeitos (13,5%). Já em relação ao controle das capitais, o MDB e o PSD empataram, ambos com 5 capitais (19,2% cada). União Brasil e PL vêm em seguida, com 4 capitais cada (15,4%). O PT ficou em nono lugar, com 252 prefeitos (4,5%), sendo apenas uma capital: Fortaleza, que elegeu Evandro Leitão, por uma diferença de 10,8 mil votos em relação ao derrotado André Fernandes (PL).

O que houve com a esquerda? 

Enquanto lideranças como Valdemar Costa Neto, do PL, Gilberto Kassab, do PSD, e Baleia Rossi, do MDB, comemoram os resultados expressivos das urnas, os caciques do PT, o maior partido da esquerda brasileira, quebram a cabeça para chegar a um consenso dos erros cometidos nessa eleição, expondo divergências em público.

Na segunda (28), o ministro de Relações Institucionais do Planalto, Alexandre Padilha, afirmou que a legenda não saiu da zona de rebaixamento quando o assunto são as eleições municipais e que é necessário fazer uma “profunda avaliação” das estratégias encampadas até o momento. Logo depois, a presidente nacional do PT, Gleisi Hoffmann, rebateu a autocrítica de Padilha ao partido e disse, numa rede social, que o chefe da pasta ofende “o partido, fazendo graça, e diminuir nosso esforço nacional não contribui para alterar essa correlação de forças”.

No entanto, nenhuma figura petista de estatura nacional inspirou unanimidade acerca do diagnóstico da esquerda nas eleições até o momento. Mas Valério Arcary, professor titular no Instituto Federal de São Paulo (IFSP) e doutor em história pela Universidade de São Paulo (USP), associa o desempenho dos campos políticos à correlação de forças instalada e crescente desde o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff.

“O que as eleições traduziram é que o campo da esquerda está na defensiva, e a hegemonia política está nas mãos da extrema direita. Isto decorre do fato de que a esquerda está perdendo a disputa política e ideológica na sociedade. A hegemonia está na mão da extrema direita, que conquistou uma posição de estar numa mobilização permanente”, analisa Arcary.

O pesquisador defende que a esquerda sabia que a correlação de forças era desfavorável, mas os resultados mostraram que tal quadro é “pior” do que o esperado. A análise do professor é que mesmo uma estratégia de campanha de ir em direção ao centro ou mais à esquerda não refletiria em um melhor desempenho. “Não dava para ganhar. A eleição mostrou que a relação de forças era muito desfavorável”, afirma.

‘A linha errada é a linha da gestão’ 

Em suas palavras, a esquerda deixou de disputar o eleitorado para garantir a governabilidade das gestões. Um exemplo é Edmilson Rodrigues (Psol), atual prefeito de Belém (PA), que terminou a eleição em terceiro lugar, com 9,78%.

“Se era para correr riscos, inclusive o risco de a direita se unir num bloco com a extrema direita e derrubar o governo através de um impeachment, com a maioria reacionária na Câmara municipal, era melhor ser derrotado lutando do que ser derrotado sem luta e nem ir para o segundo turno”, avaliou Arcary sobre a eleição na capital paraense. “Confrontos fundamentais foram evitados em nome da governabilidade.”

A linha que foi subestimada, afirma Arcary, é, nesse sentido, a “linha da gestão”. “Não são só os dois meses de campanha eleitoral, propaganda, comunicação. O que conta nestes processos é se ação do governo, que é a ferramenta de disputa importante, incide na vida de milhões de pessoas, de maneira a construir uma audiência maior”, defende.

Nessa perspectiva, o professor traz para o centro da análise o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), cujo governo “até agora não faz luta política”. “A premissa do governo Lula é que a governabilidade repousa no Congresso Nacional, e que o limite é o denominador comum mais rebaixado, que é o que garante que não haja impeachment contra o Lula. Então botamos a direita dentro do governo. A eleição nos ensina que, se a linha do governo não mudar, o Lula tampouco vai ser reeleito em 2026”, alerta.

As eleições municipais são um importante termômetro para a próxima eleição geral, a despeito das diferenças entre ambas, para Renato Eliseu Costa, professor de Políticas Públicas e coordenador de Pós-Graduação da Escola de Ensino Superior da Fipe (FipeEES). Isso porque os municípios servirão de palanque para os candidatos aos governos estaduais, aos legislativos e à Presidência.

“É nas prefeituras onde vai acontecer a exposição desses candidatos, o papel dos deputados federais buscando votos e apoiando candidatos à presidência. Então o jogo eleitoral nos municípios vai ser muito grande. E o centrão, principalmente na figura do PSD e MDB, tem avanços significativos, incluindo cidades com grande número de eleitores”, afirma Costa.

A tendência se torna ainda mais forte dado o papel importante dos congressistas na destinação de emendas parlamentares que turbinam os orçamentos dos municípios. “O papel que o Congresso Nacional tem exercido através das emendas parlamentares foi fundamental na mudança desse jogo político do município e certamente vai continuar. Se não for bem freado, se a gente não voltar para o princípio das transparências, vai ser um elemento importante nas eleições presidenciais”, afirma Costa.

“O tanto de injeção de recursos federais via Congresso Nacional, com o fortalecimento do recurso que vai para as emendas parlamentares e sem a transparência que foi feito, fortaleceu esses partidos em cidades pequenas e médias, já que aqueles prefeitos receberam bastantes recursos”, conclui. Desde 2023, os partidos de centro passaram a ocupar 50% da Câmara dos Deputados e 44% do Senado.

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