O Fantástico (TV Globo) conseguiu, com exclusividade, acesso a 55 áudios que circulavam em grupo de militares de alta patente que, de acordo com a investigação da Polícia Federal (PF), preparavam uma trama golpista após o segundo turno das eleições de 2022.
Segundo a PF, Mario Fernandes, general da reserva e ex-número 2 da Secretária-Geral da Presidência, foi o articulador do plano, que envolvia uma conspiração para matar o presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, seu vice, Geraldo Alckmin e o ministro do STF Alexandre de Moraes.
“Qualquer solução, caveira, tu sabe que ela não vai acontecer sem quebrar ovos, sem quebrar cristais”, diz áudio atribuído ao general Mário Fernandes.
O general se mostra exaltado em várias conversas.
“Tá na cara que houve fraude. Tá na cara. Não dá mais pra gente aguardar essa p…”. Mário Fernandes.
Nesse áudio, de 4 de novembro de 2022, ele alega, sem provas, que houve fraude na eleição. Pessoas próximas a Mario Fernandes e oficiais do Exército responderam assim:
“Eu tô pedindo a Deus pra que o presidente tome uma ação enérgica e vamos, sim, pro vale tudo. E eu tô pronto a morrer por isso”, afirma participante do grupo, não identificado.
“O presidente tem que fazer uma reunião com o petit comité. Esse pessoal acima da linha da ética não pode estar nessa reunião. Tem que ser a rataria. Tem que debater o que vai ser feito”, afirma um oficial do Exército.
A investigação afirma ainda que os acampamentos em frente a quarteis no final de 2022 faziam parte de um movimento orquestrado pelos militares e que o general Mário Fernandes se comunicava frequentemente com esses grupos.
“Talvez seja isso que o alto comando, que a defesa quer. O clamor popular, como foi em 64. Nem que seja pra inflamar a massa. Para que ela se mantenha nas ruas.”, afirma o general em áudios que circulavam nos grupos golpistas.
Em um outro áudio, Fernandes disse que teve uma conversa com o então presidente Jair Bolsonaro, sobre a diplomação da chapa Lula e Alckimin, no TSE:
“Durante a conversa que eu tive com o presidente, ele citou que o dia 12, pela diplomação do vagabundo, não seria uma restrição? Qualquer ação nossa pode acontecer até 31 de dezembro. Tudo. Mas aí na hora: pô, presidente. A gente já perdeu tantas oportunidades”, mostra o áudio.
No dia 12 de dezembro, data da diplomação, manifestantes tentaram invadir o prédio da PF e incendiaram carros e ônibus em Brasília.
“O senhor me desculpe a expressão, mas quatro linhas é o c… Quatro linhas da constituição é o c… Nós estamos em guerra, eles estão vencendo, está quase acabando e eles não deram um tiro por incompetência nossa”, afirmou um oficial do Exército.
A investigação apontou que o agente da Polícia Federal Wladimir Matos passou ao grupo que planejava o golpe de estado informações sobre a equipe de segurança e a localização de Lula.
A investigação, concluída pela PF na quinta-feira (21), levou ao indiciamento de 37 pessoas, entre elas o ex-presidente Jair Bolsonaro, o general Walter Braga Netto, candidato a vice na chapa de Bolsonaro; Augusto Heleno, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional; Anderson Torres, ex-ministro da Justiça; Valdemar Costa Neto, presidente do PL; e Alexandre Ramagem, ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência.
O Fantástico procurou a defesa do general Mário Fernandes e do Policial Federal Wladimir Matos, presos nesta semana pela Polícia Federal, que não foram localizadas.
Procurou também a defesa do tenente-coronel Rafael Martins de Oliveira, o outro preso citado na reportagem, mas não obteve resposta.
Em nota divulgada no domingo (24), a Ordem dos Advogados do Brasil reafirmou o apoio às instituições e à Constituição e defendeu que lideranças políticas incentivem seus partidários a se afastarem de atos de violência e de terrorismo político.
A Associação dos Juízes Federais do Brasil também se manifestou.
A AJUFE disse que fatos que atentem contra a segurança e integridade pessoal de agentes públicos configuram grave ameaça ao estado democrático de direito. Para a associação, essas práticas devem ser combatidas com o rigor da lei.
Outra entidade a se manifestar foi a Associação dos Magistrados Brasileiros.