Brasília, 08/01/2025

Justiça derruba liminar e mantém resolução do Conanda sobre aborto legal para crianças e adolescentes vítimas de violência sexual

Cristiane Sampaio
Brasil de Fato | Brasília (DF) |

O Poder Judiciário derrubou, no final da noite de segunda-feira (6), a liminar que suspendia a resolução do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) sobre o atendimento do segmento em casos de aborto legal – no Brasil, a interrupção da gravidez é autorizada quando há risco de vida para a gestante, gravidez após estupro e fetos anencéfalos. Aprovada pelo órgão em dezembro, a norma havia sido suspensa pela Justiça Federal após pedido da senadora bolsonarista Damares Alves (Republicanos-DF), que alegou desrespeito ao rito de votação do texto por parte do Conanda. Agora, a resolução volta a valer.

A nova decisão judicial resulta de despacho feito pelo desembargador federal Ney Bello, do Tribunal Regional Federal da Primeira Região (TRF-1). O magistrado destacou que a resolução em questão dispõe sobre como deve se dar o trâmite para o atendimento de crianças e adolescentes alvos de violência sexual que buscam a interrupção legal da gestação, “conforme autorizado pelo artigo 128 do Código Penal”. Bello argumentou que a suspensão dos efeitos da resolução teria sido um “equívoco crasso” por se utilizar de “artifícios formais” sob o manto do discurso de proteção dos fetos ao mesmo tempo em que “desprotege o hipossuficiente menor que tenha sido vítima de uma violência brutal”.

“De onde observar ser minimamente razoável, em defesa de vulneráveis crianças e adolescentes vítimas de abuso e estupro, lutar pela manutenção da violência gerada sustentando – por vias formais – a manutenção de uma gestação causada por um gesto violento, repugnante e atroz de um adulto? Como, em pleno século XXI, sustentar a razoabilidade da não interrupção da gravidez em casos tais?”, questionou o desembargador, que também apontou não ter havido irregularidade na decisão do Conanda. Ney Bello afirmou que o conselho teria agido “dentro de suas atribuições”.

“Uma sociedade em que suas instituições privilegiam o embate ideológico e suas verdades pré-concebidas sobre a sanidade, a liberdade e a proteção de menores vítimas de violência está fadada ao fracasso enquanto aventura da modernidade racional”, emendou o desembargador, ao suspender a decisão anterior. A aprovação da resolução havia gerado reações de atores da extrema direita, além de ter colocado em lados opostos representantes do governo federal e lideranças da sociedade civil que compõem o conselho. No caso destes dois últimos, a gestão votou contra o texto e os representantes civis, a favor.

A resolução

Aprovada em 23 de dezembro por 15 votos a 13, a resolução traz definições gerais relacionadas ao tema do abuso sexual, orientações sobre a prevenção da violência sexual e da gestação na infância, com a indicação das competências de instâncias do Estado diante de casos do tipo, entre outros pontos. O documento registra, por exemplo, “que toda criança e adolescente tem direito a ter acesso a informações sobre seu próprio corpo que permitam a identificação e a denúncia de situações de violência sexual”.

No mais, o texto indica como deve ser feito o atendimento de casos de violência no âmbito do Sistema de Garantia de Direitos da Criança e do Adolescente (SGDCA), quais os direitos do segmento atendido, além de outras orientações.

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