Adele Robichez, José Eduardo Bernardes e Larissa Bohrer - Brasil de Fato
“De 2001 para 2009, esse índice teve uma queda, mas agora se estagnou. Esperávamos que esse patamar fosse diminuindo porque temos as políticas de matrícula nas escolas públicas, que estão quase universalizadas”, observou. “Não basta só as políticas de inclusão, elas são necessárias, uma resposta importante, mas precisamos garantir também a qualidade do ensino.”
O analfabetismo funcional se refere a pessoas que têm dificuldades para ler um texto minimamente complexo, fazer inferências ou preencher formulários sozinhas. Isso compromete a autonomia no cotidiano, inclusive em tarefas digitais básicas, como acessar o site gov.br, onde são reunidos diversos serviços do governo.
A pesquisa realizada pela Ação Educativa também revelou um aumento da taxa de analfabetismo funcional entre pessoas que concluíram o ensino médio: de 12% em 2018 para 17% em 2024. Para Heloisa, o dado evidencia falhas estruturais no sistema educacional. “Temos jovens que concluem o ensino básico sem estarem plenamente alfabetizados”, afirmou.
A educadora reforça ainda que o maior impacto é entre adultos de 40 a 64 anos, faixa etária que mais depende de programas como a Educação de Jovens e Adultos (EJA), que vem sofrendo desmontes nos últimos anos. “O governo Lula vem tentando buscar e resgatar o programa, mas o desmonte foi muito grande. Durante o governo Bolsonaro, a secretaria que com a educação dos jovens adultos foi desmontada”, lamentou. Para ela, o EJA “é a grande resposta que podemos ter para melhorar os índices”.
Pretos e pardos são mais afetados
Para Heloisa Trenche, os dados sobre a desigualdade racial na educação se repetem há anos porque o Brasil ainda não estruturou uma política de educação antirracista de forma efetiva. Ela defende o cumprimento da lei 10.639, que obriga o ensino da história africana e afro-brasileira nas escolas, além de ações afirmativas como as cotas raciais, que “mudam toda a configuração familiar”, ao permitir que jovens negros sejam os primeiros a ingressar no ensino superior.
A educadora também chama atenção para o perfil de muitos estudantes da EJA, que são justamente essas pessoas negras que foram empurradas para fora da educação básica por barreiras estruturais. “Essas pessoas merecem. Elas têm o direito delas de reparação no direito à educação”, afirma. Para Heloisa, não basta investir apenas nas crianças se os pais e mães não forem letrados: “Elas vão estimular mais seus filhos, vão ter consciência da importância da escola na vida dessas crianças.”
Os dados do Inaf mostram que a população negra e, principalmente, os povos indígenas e amarelos enfrentam mais dificuldade no acesso à alfabetização plena: apenas 31% das pessoas negras e 19% dos indígenas e amarelos têm alfabetização consolidada. Entre os brancos, 41% são plenamente alfabetizados.